Um momento de tensão e simbolismo político marcou esta segunda-feira as comemorações oficiais do 25 de Novembro no Parlamento. O líder do Chega, André Ventura, interrompeu a cerimónia para retirar da mesa um ramo de cravos vermelhos, gesto que antecedeu um discurso inflamado de crítica ao Presidente da República e ao estado do país.
“Hoje é dia de rosas brancas e não de cravos vermelhos”, declarou Ventura, dirigindo-se à Mesa da Assembleia antes de prosseguir. A intervenção, que impôs silêncio ao hemiciclo, redefiniu por completo o tom da sessão solene. O líder do partido mais votado na oposição transformou a evocação histórica num amplo manifesto de acusação política.
Ventura afirmou que a data celebra o dia que “salvou a liberdade” em Portugal, impedindo que o país se tornasse “uma Cuba ou uma União Soviética no extremo oeste da Europa”. Dirigindo-se depois aos convidados e às famílias de militares presentes, defendeu a substituição de nomes de ruas que homenageiam figuras da esquerda revolucionária por outros como “Rua da Liberdade”.
O núcleo do discurso foi, no entanto, uma crítica feroz à atualidade portuguesa. Ventura denunciou uma “epidemia de corrupção que varre todas as suas estruturas” e acusou a classe política de falhar no combate a este flagelo. Afirmou que os “desvios” a combater hoje são diferentes, mas não menos perigosos.
“Onde antes lutámos pela liberdade de expressão, hoje lutamos contra a cultura de cancelamento”, declarou, referindo-se também à “carga fiscal que também nos expropria” e à emigração jovem. “Se havia futuro para dar a 25 de novembro de 75, tem que haver futuro para dar a 25 de novembro 2025”, desafiou.

O momento de maior confronto direto surgiu quando Ventura se dirigiu ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, presente na sala. Referindo-se à recente visita de Estado a Angola, acusou o chefe de Estado de ter sido “indigno” e de ter “traído os portugueses” ao não reagir quando foram chamados de “opressores” e “ladrões”.
“Ao ficar calado perante a ignomínia (…) traiu-nos, por isso, a todos”, afirmou Ventura, elevando o tom de voz. O líder do Chega, que é candidato presidencial, garantiu que Portugal, apesar de tudo, “continua de pé” e é “enorme”. A bancada do seu partido aplaudiu de pé no final da intervenção, que durou vários minutos.
A sessão solene, que assinala o 49.º aniversário do 25 de Novembro de 1975, foi assim dominada por um discurso que misturou a evocação histórica com uma agenda política contemporânea e um raro confronto institucional direto com a Presidência da República no próprio hemiciclo. O episódio ilustra a forma como a data continua a ser um campo de batalha simbólica na política portuguesa.